A situação dramática de pessoas em situação de rua tem se agravado durante a pandemia, pois além dos problemas comumente vividos por eles, as dificuldades em cumprir medidas de saúde pública, como o isolamento social e a higienização, aumentam a sua vulnerabilidade. A pandemia tende a piorar o triste quadro das pessoas em situação de rua, acentuando o preconceito e a exclusão social que sofrem. São múltiplas as suas feições. Há homens, mulheres, crianças, jovens e idosos; alguns alternando a rua com outros lugares de residência, outros, vivendo o tempo todo nas ruas, em praças, debaixo de viadutos, ou dormindo nas calçadas. Dentre eles, estão migrantes que não conseguem casa e trabalho, pessoas que perderam os laços familiares ou foram expulsas de casa, dependentes químicos e pessoas com problemas de saúde mental ou outras enfermidades.
Acusadas de violência, as pessoas em situação de rua são geralmente grandes vítimas da violência disseminada na sociedade. A violência faz parte do cotidiano deles, que sofrem agressões verbais e físicas, incluindo assassinatos enquanto dormem, conforme casos noticiados no Brasil. Trata-se de gente necessitada de condições de vida digna, de atenção e afeto, como toda a pessoa humana, mas demais fragilizada e indefesa.
Morador de rua não pode ser visto como caso de polícia, mas como uma questão social séria e um desafio para a espiritualidade e a ética cristãs. Morador de rua é pessoa humana e, como tal, dotada de dignidade inviolável e do direito incondicional à vida. O fato de estar em condições precárias de vida não pode implicar em menor dignidade ou em menor direito à vida. São filhos e filhas de Deus, criados à sua imagem e semelhança, cuja dignidade deve ser reconhecida e cujo direito a uma vida digna deve ser assegurado socialmente. Basta ouvir, com atenção e respeito, a história de um morador de rua para desvelar o seu valor, perceber as suas angústias e esperanças.
Graças a Deus, há iniciativas louváveis desenvolvidas por organizações da sociedade civil, comunidades e instituições religiosas, Pastorais Sociais, como a Pastoral do Povo de Rua, e movimentos sociais. Contudo, resta muito a fazer, especialmente, no campo das políticas públicas, bem como, no âmbito das iniciativas comunitárias.
Este tempo da pandemia, com seus múltiplos desafios, tem se revelado um tempo privilegiado para a vivência do amor fraterno, principalmente da caridade para com os pobres, os enfermos e tantas pessoas fragilizadas. Que as diversas confissões religiosas possam contribuir para construir um mundo mais justo e fraterno, dando especial atenção aos pobres e sofredores, dentre os quais, estão os moradores de rua. São irmãos e irmãs a serem amados, especialmente na proximidade do Natal.
Texto: CARDEAL SERGIO DA ROCHA – Arcebispo de Salvador (BA)
Fonte: CNBB
Imagem: CORREIO BRAZILIENSE