A liturgia do XXXIII Domingo do Tempo Comum recorda a cada cristão a grave responsabilidade de ser, no tempo histórico que vivemos, testemunha consciente, ativa e comprometida desse projeto de salvação/libertação que Deus Pai tem para os homens.
O Evangelho (Mateus 25,14-30) apresenta-nos dois exemplos opostos de como esperar e preparar a última vinda de Jesus. Louva o discípulo que se empenha em fazer frutificar os “BENS” que Deus lhe confia; e condena o discípulo que se instala no medo e na apatia e não põe para render os “BENS” que Deus lhe entrega (dessa forma, ele está a desperdiçar os dons de Deus e a privar os irmãos, a Igreja e o mundo dos frutos a que têm direito).
Na segunda leitura (Tessalonicenses 5,1-6), Paulo deixa claro que o importante não é saber quando virá o Senhor pela segunda vez; mas é estar atento e vigilante, vivendo de acordo com os ensinamentos de Jesus, testemunhando os seus projetos, empenhando-se ativamente na construção do Reino.
A primeira leitura apresenta (Provérbios 31,10-13.19-20.30-31), na figura da mulher virtuosa, alguns dos valores que asseguram felicidade, êxito, realização. O “sábio” autor do texto propõe, sobretudo, os valores do trabalho, do compromisso, da generosidade, do “temor de Deus”. Não são só valores da mulher virtuosa: são valores de que deve revestir-se o discípulo que quer viver na fidelidade aos projetos de Deus e corresponder à missão que Deus lhe confiou.
A Igreja no Brasil realiza, durante esta semana, a JORNADA MUNDIAL DOS POBRES DE 2020. A proposta inspira-se no convite feito pelo Papa Francisco em sua mensagem para a ocasião, na qual ele sugere o tema “ESTENDE A TUA MÃO AO POBRE” (Eclo 7, 32). Celebrar a Jornada Mundial dos Pobres neste ano é estarmos com as pessoas em situação de pobreza, rezar com elas e também lutar por políticas públicas, econômicas, reformas dos programas sociais e ações para a erradicação da extrema pobreza e combate à desigualdade social. Em várias partes do Brasil, diversas iniciativas são promovidas, mesmo diante da pandemia, para cumprir com esta ideia de proximidade.
“ESTENDE A TUA MÃO AO POBRE: a sabedoria antiga dispôs estas palavras como um código sacro que se deve seguir na vida. Hoje ressoam com toda a densidade do seu significado para nos ajudar, também a nós, a concentrar o olhar no essencial e superar as barreiras da indiferença”, afirma o Papa Francisco em sua mensagem.
Fonte: Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus
Leituras
Primeira Leitura – Livro dos Provérbios (31,10-13.19-20.30-31)
Salmo – Sl 127,1-2.3.4-5 (R. 1a)
Segunda Leitura – Primeira Carta de São Paulo aos Tessalonicenses (5,1-6)
Evangelho – Mateus (25,14-30)
Fonte: Liturgia Diária
Reflexão do Evangelho
AQUI TENS O QUE TE PERTENCE
“AQUI TENS O QUE TE PERTENCE”. Esta foi a resposta do terceiro empregado. “Missão cumprida, tudo em regra. Pode comprovar que não falta nada. Estamos em paz. Já não te devo nada. O que me deste, te devolvo”.
Quando alguém devolve um presente sem o abrir sequer, ou embora o tenha aberto, mas não o aproveitou em absoluto… está ofendendo tristemente a quem lhe deu.
Acontece que Deus te diz: “Aqui está: deixo uma fortuna inteira nas suas mãos (um talento equivalia ao salário de cerca de 20 anos de trabalho de um agricultor). É isso que lhe confio e deixo à sua inteira disposição. Use e distribua como você achar adequado, como você acha que eu faria. Conto com você para fazer meu trabalho enquanto estiver fora. Provavelmente atrasado para voltar”.
A parábola de Jesus quer fazer-nos saber que recebemos muito, embora não sejam todos iguais, a cada um foi dado segundo a sua capacidade. Observe que ele fornece tudo para você usar, gastar e não guardar para você. Para investir. Ele quer que sejamos criativos, empreendedores, com iniciativa.
“Porque o cristão que arrisca, tem a coragem de arriscar para trazer o bem, o bem que Jesus nos deu, que nos deu como um tesouro. Arriscar significa se envolver ”,“O confortável critério de ‘SEMPRE FOI FEITO ASSIM’ não é válido. É preciso agir com ousadia, criatividade e repensar os objetivos, as estruturas, o estilo e os métodos evangelizadores ”. (Papa Francisco).
Limitar-se a contemplar, guardar, preservar, proteger, esconder, defender… equivale a enterrar, desperdiçar…
O último empregado, aos olhos de Deus, foi preguiçoso, negligente. Ele não diz que fez coisas ruins, mas que parou de fazer coisas boas, que seus talentos (que são um empréstimo, visto que ainda são seus) estão intocados, fechados, não utilizados. Ele não conheceu ou ousou fazer algo com aqueles presentes: algo bonito, algo novo, algo que valha a pena, não fez algo “ACONTECER“. Ou ainda pior: “ELE ESTAVA COM MEDO“. Sua ideia de um Deus exigente o paralisa.
“A novidade sempre nos assusta um pouco, porque nos sentimos mais seguros se temos tudo sob controle, se somos nós que construímos, programamos, planejamos nossas vidas, de acordo com nossos esquemas, seguranças, gostos. E isso também acontece com as coisas de Deus. Muitas vezes o seguimos, o acolhemos, mas até certo ponto, é difícil nos abandonar em seus braços com total confiança, deixando o Espírito Santo encorajar, guiar a nossa vida, em todas as decisões, tememos que Deus nos guie pelo caminho novo, nos tire de nossos horizontes muitas vezes limitados, fechados, egoístas, para nos abrir aos seus ”(Papa Francisco)
O medo de errar, o medo da crítica e da rejeição, o medo de ficar só, o medo de ser desqualificado ou encurralado… «Prefiro uma Igreja arriscada porque corre riscos e procura caminhos para ser servidora no mundo de hoje, que uma Igreja doente que se isola em si mesma, por medo ou apego à sua própria segurança e tradições”.
Por outro lado, o servo fiel e submisso não “DEVOLVE” nada, mas sim “APRESENTA“. É diferente. Além disso, o mestre não lhe pede contas. Bastam os resultados. Ele sabe que por trás disso haverá histórias. Imagino que na “ALEGRIA DO SEU SENHOR”, na eternidade, haverá “tempo” para ouvi-las e desfrutá-las:
- a bondade que conseguiu colocar nos lugares mais impensáveis.
- o perdão que deu a quem menos esperava.
- o amor semeado nos corações mais secos e doloridos.
- a liberdade e a coragem de falar em defesa da justiça, da verdade, dos pobres, do emigrante…
- quando ele não se importava em investir nas causas dos perdedores (é aí que ele tirou os melhores interesses, curiosamente, mesmo que tenha “PERDIDO” o investimento).
- as amáveis palavras que ele colocou no coração de quem tanto precisava delas…
- o esforço de renovar, melhorar e recriar… quando outros diziam “NADA SE PODE FAZER” ou “NÃO VALE A PENA“, ou “É IMPOSSÍVEL” …
O mestre “demora muito para voltar”, talvez porque queira nos dar tempo para gastar tudo, para que possamos calcular e discernir onde e como usar nossos recursos. Ele não perguntou a seus servos se eles poderiam ter produzido mais. No entanto, tenho a certeza que lhe interessa saber do nosso cansaço, da paixão com que trabalhamos, da esperança que nos tem guiado, dos riscos que corremos. Inclusive os nossos fracassos… Melhor se não tivermos salvado nada “por precaução”. Porque só gastando você pode apresentar resultados. É provável que sua chegada seja até a ocasião para perceber o quanto de bem temos feito, porque muitas vezes não vemos os frutos do que semeamos.
“Aquele que recebeu um talento, fez um buraco no chão e escondeu o dinheiro de seu Senhor.”
Quantos buracos estamos fazendo na terra, podemos perceber! Quanto guardamos, escondemos, encurralamos, descartamos, subestimamos …!
- AQUI TENS “TUA” vida, Senhor. Eu devolvo para você como está. Tenho estado tão ocupado, acelerado, estressado… vivenciando… que não parei para pensar em como aproveitar isso. Eu estava indo embora… e no final não tive tempo.
- AQUI TENS “A TUA” liberdade. Eu usei muito pouco. Preferi obedecer, me deixar levar pelo que quase todos faziam, pelo que recomendavam, pelo que me mandavam fazer, pelo que esperavam de mim … Então não me meti em problemas nem em complicações. Aqui está de volta.
- AQUI TENS o coração que você me deu. Eu queria muito pouco, porque se vive tantas decepções, que machucam, se descobre que alguém é vulnerável e se aproveitam disso. Amei uns poucos escolhidos, que me podiam corresponder…
- AQUI TENS “A TUA” Palavra. Frequentemente recebia “nas missas” e “guardava” bem na memória… algumas vezes. Mas muitas vezes ficava lá, sem afetar muito minha vida, minhas decisões …
- “ AQUI TENS ” a comunidade dos irmãos na fé: não cuidei muito dela; e talvez “AQUI TENS” um pouco de fé arrojada, pouco amadurecida, pouco formada e AQUI TENS…
Sempre achei que seria bom se Jesus tivesse presenteado um servo de mãos vazias, sem nada. Mas depois percebi que mesmo sem a parábola, na realidade, já havia um Servo que arriscou tudo, que deu tudo, até a própria vida, até ficar sem nada, fracassado, abandonado… E ele foi o primeiro em entrar na alegria de seu Senhor e Pai.
O convite da Palavra do Senhor é olharmos para as nossas mãos e perceber tantos dons que Ele nos comissionou para cuidar e administrar. Não são nossos. Não me lembro quem disse que no dia de seu retorno só poderemos “APRESENTAR” ao Senhor o que distribuímos e Ele nos pedirá que prestemos contas de tudo o que guardamos para nós. O QUE PESARÁ MAIS? O ” AQUI TENS “? OU ELE OLHA O QUE FOI REPARTIDO?
Texto: Quique Martínez de la Lama-Noriega. Cmf – Ciudad Redonda
Imagem: Pixabay