O tema deste domingo é, evidentemente, o ESPÍRITO SANTO. Dom de Deus a todos os crentes, o Espírito dá vida, renova, transforma, constrói comunidade e faz nascer o Homem Novo.
O Evangelho (João 20,19-23) apresenta-nos a comunidade cristã, reunida à volta de Jesus ressuscitado. Para João, esta comunidade passa a ser uma comunidade viva, recriada, nova, a partir do dom do Espírito. É o Espírito que permite aos crentes superar o medo e as limitações e dar testemunho no mundo desse amor que Jesus viveu até às últimas consequências.
Na primeira leitura (Atos 2,1-11), Lucas sugere que o Espírito é a lei nova que orienta a caminhada dos crentes. É Ele que cria a nova comunidade do Povo de Deus, que faz com que os homens sejam capazes de ultrapassar as suas diferenças e comunicar, que une numa mesma comunidade de amor, povos de todas as raças e culturas.
Na segunda leitura (1 Cor 12,3b-7.12-13), Paulo avisa que o Espírito é a fonte de onde brota a vida da comunidade cristã. É Ele que concede os dons que enriquecem a comunidade e que fomenta a unidade de todos os membros; por isso, esses dons não podem ser usados para benefício pessoal, mas devem ser postos ao serviço de todos.
Leituras
Nunca será demais realçar o papel do Espírito na tomada de consciência da identidade e da missão da Igreja… Antes do Pentecostes, tínhamos apenas um grupo fechado dentro de quatro paredes, incapaz de superar o medo e de arriscar, sem a iniciativa nem a coragem do testemunho; depois do Pentecostes, temos uma comunidade unida, que ultrapassa as suas limitações humanas e se assume como comunidade de amor e de liberdade. Temos consciência de que é o Espírito que nos renova, nos orienta e nos anima?
que encheu a casa onde eles se encontravam.
conforme o Espírito os inspirava.
pois cada um ouvia os discípulos
falar em sua própria língua.
do Ponto e da Ásia,
também romanos que aqui residem;
Palavra do Senhor
R. Enviai o vosso Espírito, Senhor, e da terra toda a face renovai.
1a Bendize, ó minha alma, ao Senhor! *
b Ó meu Deus e meu Senhor, como sois grande!
24a Quão numerosas, ó Senhor, são vossas obras! *
c Encheu-se a terra com as vossas criaturas! R.
29b Se tirais o seu respiro, elas perecem *
c e voltam para o pó de onde vieram.
30 Enviais o vosso espírito e renascem *
e da terra toda a face renovais. R.
31 Que a glória do Senhor perdure sempre, *
e alegre-se o Senhor em suas obras!
34 Hoje seja-lhe agradável o meu canto, *
pois o Senhor é a minha grande alegria! R.
É preciso ter consciência da presença do Espírito: é Ele que alimenta, que dá vida, que anima, que distribui os dons conforme as necessidades; é Ele que conduz as comunidades na sua marcha pela história. Ele foi distribuído a todos os crentes e reside na totalidade da comunidade. Temos consciência da presença do Espírito e procuramos ouvir a sua voz e perceber as suas indicações? Temos consciência de que, pelo fato de desempenharmos esta ou aquela função, não somos as únicas vozes autorizadas a falar em nome do Espírito?
e como todos os membros do corpo,
assim também acontece com Cristo.
para formarmos um único corpo,
e todos nós bebemos de um único Espírito.
Palavra do Senhor.
Espírito de Deus,
enviai dos céus
um raio de luz!
Vinde, Pai dos pobres,
dai aos corações
vossos sete dons.
Consolo que acalma,
hóspede da alma,
doce alívio, vinde!
No labor descanso,
na aflição remanso,
no calor aragem.
Enchei, luz bendita,
chama que crepita,
o íntimo de nós!
Sem a luz que acode,
nada o homem pode,
nenhum bem há nele.
Ao sujo lavai,
ao seco regai,
curai o doente.
Dobrai o que é duro,
guiai no escuro,
o frio aquecei.
Dai à vossa Igreja,
que espera e deseja,
vossos sete dons.
Dai em prêmio ao forte
uma santa morte,
alegria eterna.
Amém.
A comunidade cristã só existe de forma consistente, se está centrada em Jesus. Jesus é a sua identidade e a sua razão de ser. É n’Ele que superamos os nossos medos, as nossas incertezas, as nossas limitações, para partirmos à aventura de testemunhar a vida nova do Homem Novo. As nossas comunidades são, antes de mais, comunidades que se organizam e estruturam à volta de Jesus?
Jesus é o nosso modelo de referência?
as portas do lugar onde os discípulos se encontravam,
Jesus entrou e pondo-se no meio deles,
disse: “A paz esteja convosco”.
Como o Pai me enviou, também eu vos envio”.
a quem os não perdoardes,
Palavra da Salvação.
Fonte: Liturgia Diária – CNBB
Reflexão
O Espírito Santo vos recordará tudo o que eu vos tenho dito
O homem que a música em si mesmo não traz, nem se comove ante a harmonia de agradável toada, é inclinado a traições, tão-só, e a roubos, e a todo estratagema, de sentidos obtusos como a noite e sentimentos tão escuros quanto o Érebo. De um homem assim desconfiai sempre. Ouvi a música. (O Mercador de Veneza – William Shakespeare)
Orar é sintonizar a sensibilidade com o diapasão do coração de Deus. O mais importante é ouvir o som de Deus para colocar nosso coração em sintonia com ele. Deixe Deus, Vida, Amor, Natureza, Universo, Silêncio… deixe-os soar dentro de nós, fazendo vibrar as fibras mais íntimas de nossa sensibilidade (F. Moreno Muguruza).
O grande guitarrista espanhol, Andrés Segovia, transformou a guitarra espanhola de simples instrumento “popular”, em um instrumento para concerto. Ele deu um recital de guitarra memorável em “La Herradura“, uma cidade na costa de Granada (Espanha), onde viveu os últimos anos de sua vida. Antes de começar, ele contou graciosamente como nasceu sua vocação, seu despertar para a música. Ele voltou aos seus anos de infância. Em Linares (Jaén, Espanha), sua cidade natal. Lá, passava de vez em quando um personagem curioso, carregando os mais variados utensílios e trazendo ilusão especialmente para as crianças. Toda uma loja itinerante com quinquilharias: livros exóticos, adesivos de todas as cores, borboletas de pelúcia, brinquedos para crianças, bonecas vestidas de azul para meninas… . De repente, aquele homem pegou um violão e começou a tocá-lo. Aquele menino que era então Andrés Segovia nunca tinha visto um violão, nunca tinha ouvido sua harmonia. “Então -disse Andrés Segovia- recordei-me da música”.
A música estava dentro daquele menino chamado Andrés. Alguém a havia plantado generosamente ali, mas a música dormia escondida, expectante, embora circulando com o sangue nas veias. Aguardava que “algo” ou “alguém” para retirá-la, fazê-la sair.
Revendo e lendo essas confidências de Andrés Segovia, entendi melhor quem ele era e o que o faz o ESPÍRITO SANTO.
O Evangelho de João afirma que Jesus disse:
“O Defensor, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará tudo e vos recordará tudo o que eu vos tenho dito”. (Jo 14, 26).
Recordar significa que ensinamentos estão dentro do coração guardados, esquecidos, adormecidos, esperando… Ao recorda-los, ao prestar atenção, ao deixar que voltem desde o coração para a mente, começam a liberar toda a sua carga… e se tornam o que são: anúncio vivo, comunicação, interpelação, sentimentos, significado…
Todas as palavras – também as palavras de Jesus no Evangelho, aquelas que ouvimos repetidamente em cada liturgia, na nossa oração pessoal, em certas conversas ou leituras – estão adormecidas, enterradas atrás de uma camada de cinzas, sob um cobertor de brasa. Quantas vezes as palavras nos chegam como sons empoeirados e passageiros, sem sentido, com mensagens que não descobrimos… Mas algumas delas se escondem e ficam dentro.
E de repente, quando ele quer, o ESPÍRITO sopra, e aquelas palavras até então vulgares ou enigmáticas, ou irreconhecíveis, ou não compreendidas, tornam-se palavras verdadeiras, cordiais, com sentido, com música. O Espírito insufla, e vivas brasas incandescentes aparecem no fundo da alma, queimando-nos e abrasando-nos. Então surge: “agora entendi!”, “aí está a saída!”, “como eu não percebi antes!”… Agora está “claro”.
Pronunciamos palavras, jogamos montes de palavras ao vento, que o vento leva… Até que um dia percebemos o que são e representam, o quanto podem se tornar importantes, o que podemos dizer a nós mesmos nelas, as pontes que devemos cuidar no mais íntimo de nós mesmos. E então começamos a conversar e a nos comunicar, a acolher, a deixá-los viver. Isso é o que o ESPÍRITO faz.
Vemos rostos, rostos anônimos, sombras que passam por perto… até que, de repente, alguém ilumina nossos olhos por dentro, e quando olhamos descobrimos o rosto único de alguém. E podemos chamar-lhe “tu” e “Tu”. Para invocá-lo pessoalmente. Isso é o que o ESPÍRITO faz.
Ele desperta em nós tudo o que é belo e que está escondido. É o sopro que dá vida às brasas, o sopro que inspira as palavras, aquele que nos faz lembrar aquela música esquecida que todos guardamos dentro e que o Semeador das Estrelas plantou em uma manhã em nossos corações.
E finalmente o Espírito nos faz soltar um grito animado, feliz, esperançoso, sem que saibamos como nem por que, e nosso instinto mais profundo geme e nos faz voltar para Deus, surpreendentemente, sem medo, livremente com um grito maravilhoso: PAI, QUERIDO PAI, ABA. Isto é o que São Paulo nos disse hoje
O QUE É QUE O ESPÍRITO SANTO TEM QUE DESPERTAR OU LEMBRAR EM MIM?
- Deve ajudar-me a descobrir e resgatar o essencial, o que há de melhor em mim, a imagem de Deus em mim… para que eu possa remover todo o pó e cinzas inúteis, que outros e inclusive eu mesmo coloquei para afogar a voz de Deus em mim.
- Com a sua ajuda vou guardar a Palavra no meu coração, mesmo que não a entenda, mesmo que não goste, mesmo que neste momento ela não pareça contribuir em nada para a minha vida… e Ele a fará despertar e recordar quando eu precisar ouvir e entende-la. E vai me iluminar, abrindo caminhos para mim. A Palavra de Jesus não será perdida ou esquecida em meio a tanta conversa.
- Despertará em mim a PAZ quando meus erros, limitações e conflitos a tirarem de mim, quando as responsabilidades forem muito grandes, quando as tarefas forem muito numerosas, quando eu me sentir julgado (com ou sem razão) ou magoado em meus sentimentos…
- Me recordará que sou “habitado” quando pareça que estou sozinho, ou mal compreendido, ou quando as coisas não correm como eu queria. E isso me recordará que sou um filho de Deus, um herdeiro de Deus, um coerdeiro com Cristo, e que com ele partilharei a sua glória (Romanos 8:8-17).
VEM ESPÍRITO SANTO, e ensina-me a escutar a música da vida. Toque meus ouvidos espirituais para que eu aprenda a apreciar essa canção que você está criando com cada coisa que tenho para viver.
Ajude-me a apreciar todos os sons, e também os silêncios, porque até o que eu acho desagradável pode fazer parte dessa bela canção.
VENHA ESPÍRITO SANTO, ilumine minha vida, para que eu não me tranque para lamentar o que me falta e o que perdi. Não me deixes fechar o meu coração às coisas novas que queres fazer nascer em mim, VEM para que eu me atreva a percorrer aquele novo caminho que me propões, quando os outros caminhos se perderam.
Ensina-me a escutar com o coração, para que eu reconheça que quando uma nota se apaga, uma nota diferente começa a soar, outra corda começa a vibrar e a vida continua. VEM ESPÍRITO SANTO. Amém.
(Victor Manuel Fernández)
Texto: Quique Martínez de la Lama-Noriega, cmf
Fonte: Ciudad Redonda